quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

Estupefata

     Vi um casal de idosos, diferente daqueles que vemos nos comerciais. Era um casal real, da vida real. Pareciam irritados, presos na triste realidade de se suportarem até o fim de seus dias. Tanto sabiam um do outro, tanto já partilharam, se amaram, se ajudaram, mas o que restou foram as lembranças amargas dos dias pesados. O amor se foi, poderia dizer, mas como sou adepta da ideia de que o amor não acaba, nesse caso, devo dizer que ele está em algum lugar, muito bem guardado. Até um pouco sufocado. Não se deixa transparecer, não exala perfume algum. Nenhum sorriso, nenhuma cumplicidade. Pelo contrário, haviam acusações. Acusavam-se de uma vida torpe. Enquanto isso eu pensava: mas e os filhos? Os netos? As lembranças da juventude? As boas lembranças, enfim, para onde foram? Desceram rio abaixo, passaram, juntamente com os anos em que viveram juntos – e esses não foram poucos – pegando carona com as decepções que se represaram e agora jorram por litros sem fim – concluí.
     Porém, um instante de pasmo e surpresa me desviaram a atenção dessa cena.  Senti-me  ingênua, otimista e jovem demais. Julguei por um momento, calei por outro, soluções me vieram  à mente, consenti, me irritei e por fim, não havia mais o que sentir ou pensar. Só eles sabem o que viram e viveram  sobre esse chão. Mas... , não havia espaços para “mas”.
     Um tanto egoísta suspirei aliviada por aquela não ser a minha história e por saber que na minha, ainda cabem possíveis “mas, porém, contudo, todavia e entretanto”. É preciso saber viver... e conviver! 

Dayana.


Imagem: http://kdfrases.com/frase/100519